quinta-feira, 29 de abril de 2010

Perdão às Mães- Rosely Sayão

São Paulo, quinta-feira, 29 de abril de 2010 -Folha de São Paulo - Equilíbrio

ROSELY SAYÃO

Perdão às mães
Como a data em que se comemora o Dia das Mães está próxima, quero aproveitar e, em nome de muitas escolas, pedir perdão a mulheres que têm filhos que frequentam todos os níveis do ensino básico e da educação infantil.
Senhoras mães: perdão por reclamarmos de seus filhos, por muitas vezes sugerirmos que eles possam ter algum problema emocional, físico ou intelectual e até solicitarmos que eles sejam levados a algum especialista.
É que nossa tradição é a de lidar com alunos exemplares ou medianos, os quais não nos convocam a pensar, refletir ou agir de modo diferente do que estamos acostumados. Então, para evitar que eles revelem as nossas falhas e os nossos limites, adotamos essa postura de creditar a nossos alunos -os seus filhos- alguns defeitos que precisariam ou deveriam ser consertados.
Senhoras mães: perdão por invadirmos tanto a privacidade de sua família, por fazermos tantas perguntas com a finalidade de ter informações que nem usaremos em benefício de seus filhos no exercício de nossa função.
Afinal, saber se nosso aluno foi desejado como filho, como vivem seus pais e quais os problemas que enfrentam e conhecer alguns segredos familiares, por exemplo, não facilita nosso trabalho pedagógico com os alunos, por mais que digamos que sim.
Senhoras mães: perdão por julgarmos e criticarmos a maneira como cuidam de seus filhos e os educam. Demos para acreditar e nem sabemos ao certo o porquê que sabemos mais do que vocês a respeito da educação familiar nem nos damos conta de que, com os nossos próprios filhos, muitas vezes nos comportamos do mesmo jeito que vocês.
Temos nos confundido no exercício de nosso papel e não raras vezes queremos educar vocês em vez de ajudarmos os nossos alunos.
Senhoras mães: perdão por enviarmos tantos bilhetinhos e correspondências na agenda a respeito do que se passa com seu filho na escola, convocarmos sua presença para tantas reuniões coletivas e algumas pessoais e, inclusive, solicitarmos sua intervenção em assuntos que, na verdade, são entre seu filho e a escola.
O problema é que não sabemos mais ao certo como lidar com crianças e adolescentes, não conseguimos encontrar estratégias para resolver as situações problemáticas diretamente com eles aqui no espaço escolar e, por isso, apelamos para sua intervenção na esperança de que as coisas se resolvam dessa forma.
Senhoras mães: perdão por fazermos vocês pensarem que a vida escolar de seus filhos é a coisa mais importante da vida e, assim, contribuirmos para que a função materna fique tão parecida com a função docente.
Por fim, perdão por insistirmos nessa história de comemoração do Dia das Mães e, assim, colocarmos tantas mulheres em situações difíceis perante seus filhos.
Esquecemos que muitas delas não podem por razões que nem nos interessam -ou não querem- comparecer às festas que programamos com o intuito de agradar as mães de nossos alunos. E nessa hora -devemos reconhecer- nem nos lembramos de que não faz parte de nossas funções promover esse tipo de atividade.
Sabemos que pedir perdão é pouco, senhoras mães. Por isso, nos comprometemos a fazer uma reflexão crítica de nosso trabalho.



--------------------------------------------------------------------------------
INDICAÇÃO
O filme "Um Grande Garoto" é ótimo para uma diversão familiar no fim de semana e ainda pode promover boas conversas sobre o relacionamento das mães com os filhos.
Um Grande Garoto
Diretores: Paul Weitz & Chris Weitz
Classificação indicativa: 12 anos

ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)

roselysayao@uol.com.br

blogdaroselysayao.blog.uol.com.br

4 comentários:

Unknown disse...

Muito bom artigo Rosely.
Eu não tenho mais crianças, mas tenho netos e acompanho o relacionamento criança-escola. Cada vez mais a escola tenta transferir suas responsabilidades para a família. Eu tenho muito claro que a função da família é educar e formar seus filhos, enquanto cabe às escolas o ensino formal. Atualmente além de as mães cuidarem e educarem seus filhos elas recebem da escola lição de casa para ser feita em conjunto com eles. Acho o fim do mundo.
Parabéns pelo artigo.

Delma disse...

Adriana

Não sou a Rosely. Apenas publiquei a crônica dela no meu Blog, por concordar com o que ela diz no artigo. A lição de casa, eu entendo que, deve ser para formar o hábito do estudo, da pesquisa, da leitura fora da escola, jamais para os pais "fazerem" a tarefa junto. A função dos pais é apenas orientar, incentivar, esclarecer quando necessário.
Um abraço

Anônimo disse...

Delma, vc é professora? Em que vc concorda nesse texto?

Delma disse...

Respondendo ao Anônimo

É uma pena você não ter colocado seu nome.

Eu fui professora da rede pública e me aposentei em 1990. Eu concordo com todo o texto.
Ou eu não entendi o texto ou a Roseli não conseguiu se fazer entender, porque você não é a primeira pessoa a "discordar" dos pedidos de desculpas às mães. Acredito que o argumento de quem discorda é que os professores se empenham, se desdobram, as famílias não colaboram, os alunos estão cada vez mais indisciplinados,etc, etc...Sei das agruras e de todos os perrengues enfrentados pelos professores e tenho o maior respeito por esta profissão tão pouco valorizada. Mas...exatamente porque fui professora é que concordo com a Roseli. O aluno denominado pelo sistema de "criança-problema" é uma vítima de uma estrutura caduca, arcaica, despreparada, que acaba segregando, quando deveria integrar. E o verdadeiro papel da escola é Educar,no seu sentido mais amplo e não apenar ensinar. O que eu vi e vivi foi "criança problema" não aprende, atrapalha, a família é culpada, então ela é que tem que resolver. E a escola deixa de exercer o seu verdadero papel. Aqui está generalizado, mas sei que tem maravilhosas exceções, e que verdadeiros milagres de uma educação transformadora tem acontecido. Gilberto Dimenstein é o mais entusiasmado divulgador destas iniciativas. (www.dimenstein.com.br)
Eu torço por essa educação transformadora em que a criança deixe de ser "problema" e possa ser a "solução" para um mundo mais justo e mais humano.Espero que eu tenha conseguido me fazer entender.