terça-feira, 29 de dezembro de 2009

29/12/2009 - Eterno


Ano acabando e eu precisando me eternizar.
Que pena!
Já compreendi "o sentimento do efêmero."
Tarde demais!
Ou não?
Você pode me ensinar?


Eterno
Carlos Drummond de Andrade

E como ficou chato ser moderno.
Agora serei eterno.
Eterno! Eterno!
O Padre Eterno,
A vida eterna
E o fogo eterno

(Le silence éternel de ces espace infinis m’effraie)

- O que é eterno Yayá Lindinha?
- Ingrato é o amor que te tenho.

Eternalidade eternite eternaltivamente
eternuávamos
eterníssimo

A cada instante se criam novas categorias do eterno.

Eterna é a flor que se flana
Se souber abrir
é o menino recém-nascido
antes que lhe dêem o nome.
e lhe comuniquem o sentimento do efêmero
é o gesto do enlaçar e beijar
na visita do amor às almas
eterno é tudo aquilo que vive uma fração de segundo
mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma força o resgata
é minha mãe em mim que a estou pensando
de tanto que a perdi de não pensá-la
é o que se pensa em nós se estamos loucos
é tudo que passou, porque passou
é tudo que não passa pois não houve
eternas as palavras, eternos os pensamentos; e passageiras as obras
Eterno, mas até quando? É esse marulho em nós de um mar profundo.
Naufragamos sem praia; e na solidão dos botos afundamos.
E tentação e vertigem; e também a pirueta dos ébrios.

Eternos! Eternos, miseravelmente.
O relógio no pulso é nosso confidente.

Mas não quero ser senão eterno.
Que os séculos apodreçam e não reste mais do que uma essência
ou nem isso.
E que eu desapareça e fique em chão varrido onde pousou uma sombra
E que não fique no chão nem fique na sombra
mas que a precisão urgente de ser eterno bóie como um esponja no caos
e entre os oceanos de nada
gere um ritmo.

Carlos Drummond de Andrade - Poesia Completa
Fazendeiro do Ar
Editora Nova Aguilar
p. 407-9

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