Na quinta-feira dia, 20 de maio 2010, fui até a praça Clarimundo Carneiro assistir a primeira parte do Circuito Double de Dança onde a Companhia de Dança SESIMINAS, de Belo Horizonte, apresentou a coreografia "Construção".
Estacionamos na Av. Afonso Pena e enquanto nos dirigíamos para a Praça, comentei com o Eurípedes sobre como Uberlândia mudou. Ha quarenta anos eu passava por alí para ir à Faculdade de Filosofia ( no antigo Colégio N. Senhora) e havia um grande movimento de pessoas indo e vindo, os estabelecimentos comerciais com as luzes acesas, mantinham a avenida alegre e movimentada. Hoje, tudo escuro, muitos carros nas ruas e pouquissimas pessoas à pé. A nostalgia tomou conta de mim e quando começou a apresentação me emocionei e meu coração nostálgico se encheu de alegria porque a coreógrafa, além da música Construção, utilizou canções dos grandes festivais dos anos 60 e 70 que acompanhamos, torcemos, vibramos e determinaram nosso gosto musical. As músicas: Alegria, Alegria; Ponteio; Para Lennon e McCarthney; João e Maria, A Banda e Sabiá, me fizeram lembrar uma época importante da minha vida, quando saltei da despreocupada adolescência para a consciência de que o sonho não havia acabado, mas não era tão colorido e por longo tempo seria vivido em preto e branco.
Chico Buarque com seus olhos "cor de ardósia", despertou em todas nós, meninas moças da década de 60, muita admiração e paixão.
A música Construção de 1971 narra os últimos momentos da vida de um operário. Chico chegou próximo da unanimidade com esta música. A letra primorosa, que alterna rimas em proparoxítonas, chegou a receber uma agressão de péssimo gosto de David Nasser que sugeriu a inclusão de mais uma proparoxítona, “ Médici,” o presidente da época. Conta-se que o advogado da Philips, ao entregar a letra para os censores, usou nova estratégia e pediu que a proibissem. Para contrariá-lo, liberaram sem cortes.
“Alegria, Alegria” de Caetano Veloso não foi coreografada, mas fez parte do espetáculo. Esta música, 4º lugar no Festival Record de 1967, remete ao Cinema Novo com letra-câmera-na-mão, pois possui ritmo cinematográfico. Chocou os tradicionalistas mas caiu no gosto popular. Este festival é inesquecível para mim. A primeira pessoa a defender “Alegria, Alegria” foi Cristina Ribeiro, aluna da História, com lugar cativo na sede do Diretório Acadêmico, onde eu a ouvi dizendo: esta música é a melhor de todas. Os corredores, escadas e rampas da faculdade foram o palco da nossa cantoria da música mais fácil de cantar - “Belinha” de Toquinho, defendida por Wilson Simonal. “Ponteio” de Edu Lobo, cantada por ele e por Marilia Medalha, uma das músicas do espetáculo acima, era cantada por nós e executada ao piano pela Sandra Santos (toda vez que eu digo isso, ela me pergunta se era Ponteio de Camargo Guarnieri), quando as freiras liberavam o auditório onde tinha o piano. Foi o festival de “Domingo no Parque” de Gilberto Gil que contou com a apresentação dos Mutantes (Rita Lee), “Maria, Carnaval e Cinzas” defendida por Roberto Carlos (tenho um compacto em vinil desta música, presente das companheiras de torcida), “Beto bom de bola” do Sergio Ricardo que diante das vaias quebrou o violão e jogou na platéia depois de dizer “Vocês ganharam! Vocês ganharam! Mas isso é o Brasil não desenvolvido. Vocês são uns animais!”. E o Chico, que não podia faltar, com “Roda Viva” obteve o 3º lugar. Dia de festival era práticamente dia sem aula. Prova, nem pensar. O negócio era correr prá casa e assistir na antigona Tv em preto e branco, com chuvisco e som ruim as nossas músicas prediletas.
“João e Maria” - esta música de Sivuca (1947) recebeu letra de Chico Buarque. Sivuca não entendeu a frase “o meu cavalo só falava inglês” então perguntou o significado a Francis Hime que arriscou “ Eu acho que era um cavalo muito educado”.
“A Banda” – Uma das Vencedoras do II Festival da MPB em 1966, polarizou as torcidas pelas favoritas “Disparada” (Vandré) e “A Banda.” Na final dia 10/10/66, Chico propôs o empate, ameaçando não ir receber o prêmio sozinho. Decidiram dar o 1º lugar para as duas. O resultado verdadeiro 7 a 5 para “A Banda” só foi revelado quase 40 anos depois por Zuza Homem de Mello, que mantinha o cofre com o resultado na sua casa. Carlos Drummond de Andrade dedicou uma crônica à Banda e até Nelson Rodigues exaltou a canção. A esquerda que insistia em ouvir músicas de protesto via no lirismo e singeleza da Banda um retrocesso. Chico diz que a retomada ao lirismo foi proposital, pois ele não era assim tão inocente.
Sabiá – Música de Tom Jobim e letra de Chico Buarque foi inscrita no III Festival Internacional da Canção em 1968. Neste festival Caetano Veloso competiu com “É Proibido Proibir” e, muito vaiado, teve que interromper a apresentação e disse “Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Vocês têm coragem de aplaudir, este ano, uma música, um tipo de música que vocês não teriam coragem de aplaudir no ano passado?” e ainda recusou o 5º lugar em solidariedade a Gilberto Gil que não classificou “Questão de Ordem.” Na final, a disputa ficou com “Prá não dizer que não falei das flores,” de Vandré e Sabiá, interpretada por Cynara e Cybele. “Sabiá” foi a vencedora sob intensa vaia. Vandré, o segundo lugar dizia: “Gente, vocês não me ajudam desrespeitando Chico e Tom.” Chico estava na Itália, e Tom confessa que chegou a chorar por causa das vaias. Sabiá venceu a fase internacional com vaias e muitos aplausos.
O espetáculo termina com “Para Lennon e McCarthney” de Milton Nascimento e eu volto para casa com uma saudade de um tempo em que nossos ídolos faziam MÚSICAS que são capazes de emocionar mesmo 40 anos depois.
Fontes: Wagner Homem (Chico Buarque); http://www.candangocantador.com.br/festivais1967_record.php ; sites variados sobre MPB, que esqueci de anotar para publicar aqui.
2 comentários:
Qualquer outra palavra aqui será insignificante diante da beleza e emoção do que Você escreveu.
Beijos, Alcy
Quando revemos coisas que nos fazem lembrar belas passagens da nossa vida sentimos a alma leve e feliz.
Bjs
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